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"Tables sans couples"

Exposição de Pintura de Catarina Castel-Branco, patente ao público de 19 de maio a 10 de julho, na Casa-Atelier Vieira da Silva.

19 Mai a 10 Jul 2016

Casa-Atelier Vieira da Silva
Alto de São Francisco, 3 1250-028 Lisboa
Preço
Entrada livre

Texto de Ana Sousa Dias

 

Lugares misteriosos
Desde que começámos a conversar sobre esta exposição TABLES SANS COUPLES, tive muitas vezes o impulso de pedir à Catarina para visitar o seu atelier mas nunca o fi­z. Na minha fantasia, o atelier da Catarina Castel-Branco é uma espécie de caverna de alquimista. Suponho que, no fundo, não quero conhecer o espaço, com medo de perder esta ilusão de achar que ali se passam fenómenos raros.
E tudo isto por três razões (tenho feito muita introspeção para perceber a fantasia). Primeiro que tudo, porque quando ela fala da pintura chama-lhe sempre trabalho e discorre com um entusiasmo que envolve gestos largos, a voz a mudar de cor conforme o que descreve. E o que descreve é um trabalho de pigmentos, matérias naturais, papel japonês, aguadas de madeira, cores feitas com bagas, colagens das coisas mais variadas, plantas selvagens. Materiais inventados por ela, fabricados por ela e por Henrique. É como se estivesse a contar histórias a uma criança, e por isso imagino até que há-de passar esta sensação aos alunos que lhe apareçam pela frente.
A segunda razão é um homem do qual apenas sei o nome e que é o instigador desse lado de experimentação, capaz de fazer do material mais simples um elemento vital: o arquiteto Henrique Schreck. Ela descreve-o como um ser extraordinário, capaz de construir instrumentos musicais e projetar casas de terra que alteram a paisagem sem a destruir. Quando começa a preparar uma exposição, é frequente dirigir-se ao Alentejo – onde aliás nasceram e se desenvolveram algumas das obras que já expôs. É no Monte do Henrique, no seu atelier, que depois de longas conversas sempre inacabadas nascem muitas das suas obras.
A terceira razão, antes de chegar aos doze quadros desta exposição neste atelier tão cheio de sensações e memórias, é também um arquiteto. Duarte Castel-Branco, o pai da Catarina. Conheci-o em tempos, voltámos a ver-nos na inauguração da exposição da Catarina em Abrantes e depois na casa mágica da Ónia, à beira Tejo, aquecidos por um chá. Foi lentamente, nessa dia de Abrantes e noutras conversas, que aprendi a forte ligação da Catarina à mãe, Margarida, também ela pintora, e a outra fi­gura tutelar, e também pintora, Maria Lucília Moita. E percebi como de geração em geração a pintura foi sendo uma herança guardada com um amor de entendimento perfeito.
A casa encantada é outra chave para a obra da Catarina Castel-Branco, aqui com doze pinturas que apetece dizer que são natureza vivas. “TABLES SANS COUPLES”, inspiradas nos “Quartos Imaginários” de Nikias Skapinakis e em especial neste universo de Maria Helena Vieira da Silva e Arpad Szènes, com os desenhos de Arpad da “Histoire du couple table”. Vieira e os quadrados já sem se perceber se é ela ou a mesa, ele a abraçá-la por detrás, já sem se saber se é ele ou se é ela.
A Catarina fez os primeiros dez quadros no Alentejo, depois parou quando foi convidada para expor aqui, e naturalmente completou a série com os últimos dois quadros. Dos primeiros para estes, percebe-se o aperfeiçoamento da técnica, ou das técnicas, para ser mais precisa. Nestes “TABLES SANS COUPLES” que não têm figuras humanas parece que há gente lá dentro, o ambiente aquecido pelas suas maneiras e pelas suas memórias. Sim, a Catarina explicará que isto são resinas acrílicas, camadas sobrepostas lentamente, e que os pigmentos são naturais, e explicará as técnicas de alquimia que, de novo, tiveram a colaboração de Henrique Schreck. A obra acabada é tudo isso e mais a imaginação, a criação de uma coisa que não existia antes e que é bom que tenha sido construída. Faz-me ir de novo ao calor da braseira da Ónia, imaginar os corredores e os objetos antiquíssimos, com uma família lá dentro há 400 anos e muitos amigos sempre a entrar e a sair, em torno de uma mesa, em torno de um amor comum à arte e à vida.

Lisboa, maio de 2016

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