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Ópera

"Anna Bolena" no Teatro de São Carlos

Tragédia lírica de Gaetano Donizetti, com um elenco liderado por Elena Mosuc (como Anna Bolena) e com o Coro do Teatro Nacional de São Carlos e a Orquestra Sinfónica Portuguesa. A direção musical é de Giampaolo Bisanti.

4 Fev a 14 Fev 2017

Teatro Nacional de São Carlos
R. Serpa Pinto 9, 1200-442 Lisboa


Anna Bolena
regressa a São Carlos 33 anos após a última apresentação, com encenação de Graham Vick

Anna Bolena, estreada em Milão em 1830, é a primeira ópera do ciclo das “Três Rainhas de Donizetti” (a par de Maria Stuarda Roberto Devereux) e foi igualmente o primeiro sucesso do compositor Gaetano Donizetti.

O libreto de Felice Romani segue de perto os acontecimentos históricos que decretaram a morte de Ana Bolena, rainha de Inglaterra e segunda das seis mulheres de Henrique VIII.  Contudo, como era de resto comum na época, o libreto não retrata fielmente os factos históricos – nem seria esse o objetivo, conforme explica Romani no Avvertimento do libreto – mas procura sobretudo os elementos chave do drama, abrindo as portas para a inspiração de Donizetti. Romani interpreta as personagens históricas e dá-lhes uma vida própria e adaptada aos principais ingredientes de uma ópera de sucesso do século XIX.

Das diferenças entre a realidade historicamente construída e a ficção narrada, a Anna Bolena da ópera surge como inocente e sofrida, sobretudo nos últimos momentos antes da sua execução, acentuando a componente dramática com ênfase no seu desespero e loucura, ao contrário da Ana Bolena histórica, que se manteve em paz e revelou sempre grande coragem.

A visibilidade internacional do compositor chegou também com esta ópera, que foi interpretada em alguns dos mais importantes teatros da Europa, nomeadamente em Londres e Paris, em 1831, e posteriormente em Nova Iorquee noutras cidades. Em Portugal, Anna Bolena estreou em 1834, marcando a reabertura do Real Teatro de São Carlos depois de ter encerrado entre 1829 e 1834, em virtude das lutas miguelistas.

Na segunda metade do século, Anna Bolena desapareceu quase totalmente do circuito dos principais teatros, ressurgindo um particular interesse já no século XX, em 1947, no Teatro del Liceo de Barcelona e, dez anos depois, no TeatroLa Scala de Milão, numa encenação de Luchino Visconti com a participação de Maria Callas no papel titular numa das suas inesquecíveis interpretações.

Entre intrigas, amor e morte, Donizetti conseguiu uma certa plasticidade no modo como pensou a música e os números vocais como forma de expressão do drama intenso, tornando Anna Bolena num dos exemplos mais elevados do bel canto na tradição da ópera romântica italiana.

Em São Carlos, a ópera regressa após a última apresentação ter tido lugar em 1984, agora numa produção estreada em 2007 pela Fondazione Arena di Verona e assinada por Graham Vick, que em São Carlosencenou duas novas produções memoráveis: Werther (2004 e 2014) e Der Ring des Nibelungen 2006-2009 internacionalmente conhecido por "The Lisbon Ring".

Vick salienta que a ópera foi deliberadamente criada para não ser apenas um drama musical, mas também uma exibição dos dotes vocais, escrita a pensar não só no virtuosismo mas também na expressão. Há nela influências do século XVIII e tem um belo mas elaborado libreto que exige sensibilidade e autoridade no discurso e não apenas acrobacias vocais. São óperas escritas para monstros.

Para Patrick Dickie, Diretor Artístico de São Carlos, 'Anna Bolena’ é uma ópera do repertório cuja prova de fogo para todos os seus intérpretes atrai o público. A produção de Grahm Vick é sumptuosa, visual e fisicamente cativante e estou particularmente ansioso por ver e ouvir o desempenho de Elena Mosuc no papel titular.

Argumento

Ato I

Nos aposentos da rainha, os cortesãos comentam que a sua estrela deixou de brilhar, pois o coração inconstante do rei arde agora por outro amor. Anna entra, e repara que todos parecem tristes; chama Giovanna Seymour, a sua dama de companhia e confidente, para lhe dar parte das suas preocupações. Como a triste disposição da rainha afetou todos os cortesãos, Anna pede a Smeton, o pajem, que toque a sua harpa e cante para os presentes.

Terminada a canção, todos se retiram, exceto Giovanna. Quase imediatamente, entra Enrico VIII que afirma que o seu amor por Giovanna é cada dia mais forte e que, a seu tempo, ela estará a seu lado junto ao altar. Quando o rei parte, Giovanna inquieta-se com tal situação e de como ela afetará a rainha. Contudo, decide que o caso foi já longe demais para o terminar.

No dia seguinte, Lord Rochefort, irmão de Anna, cavalga no parque de Richmond e encontra o antigo amante de sua irmã, Lord Riccardo Percy. Surpreendido, Rochefort pergunta a Percy porque regressou, ao que este responde que foi o próprio rei que o chamou do exílio. Percy quer saber se a rainha está feliz depois de ter ouvido rumores da deterioração da sua relação com o rei. Rochefort tenta esquivar-se da resposta, mas observa que o amor nunca se dá por satisfeito. Entram os caçadores. Percy sente-se nervoso ao pensar que poderá avistar-se com Anna, o seu primeiro amor. Chegam o rei e a rainha, que expressam surpresa ao verem Percy. O rei recusa que Percy beije a sua mão, mas afirma!” que Anna lhe dera todas as provas da sua inocência.

O rei pede a Hervey, um seu oficial, que espie todos os gestos e palavras de Anna e de Percy. Smeton, que se apaixonou pela rainha, roubou-lhe um pequeno retrato e veio devolvê-lo. Antes de poder fazê-lo, ouve um barulho no exterior dos aposentos, e esconde-se por detrás de um biombo. Entra a rainha com o seu irmão Rochefort que lhe pede que conceda algum do seu tempo a Percy. Concorda, o que chama a atenção a Smeton, impossibilitado de abandonar os aposentos, pois será apanhado.

Sai Rochefort e Percy entra nos aposentos. Percy diz à rainha que sabe da sua infelicidade e ela responde-lhe que o rei começou a detestá-la. Percy confessa que ainda nutre estranhos sentimentos por ela, e pede-lhe que parta com ele. Anna recusa; Percy desembainha a espada e tenta matar-se. Quando a rainha grita, Smeton pensa que Percy está a atacá-la, e sai apressadamente do seu esconderijo. Os dois começam a lutar. O rei e os cortesãos irrompem pelos aposentos. O rei ordena que sejam presos, mas Smeton defende a inocência de Anna, afirmando que, caso esteja a mentir, o rei poderá apunhalá-lo em pleno coração. E, ao rasgar a camisa, o pequeno retrato de Anna cai aos pés do rei. Satisfeito, encontra uma prova para condenar Anna, e ordena que os ofensores sejam levados para a prisão. Anna diz a si própria que o seu destino está selado.

Ato II

Giovanna chega para ajudar a rainha a escapar à sua execução iminente e diz-lhe que, se ela confessar o amor por Percy, o rei conceder-lhe-á a liberdade e o divórcio. Anna, fiel aos seus deveres e ao juramento do matrimónio, recusa e deseja à sua sucessora uma coroa de espinhos. Giovanna, sentindo- -se culpada, revela que é a amante secreta do rei. Tal confissão enfurece Anna, que sossega quando Giovanna a convence de que o culpado é o rei.

Hervey diz aos cortesãos que Anna está perdida porque Smeton, na esperança de salvá-la, revelou que ambos tinha uma relação. Entra o rei a quem Hervey informa que Smeton caiu na armadilha; o rei pede a Hervey que faça com que Smeton continue a pensar que salvou a vida de Anna.

Anna e Percy são trazidos aos aposentos, separadamente. Enrico afirma que Anna se envolveu com Smeton e que disso há testemunhas. Percy jura que ele e Anna se casaram antes de Anna desposar o rei, mas o rei não acredita nele e ambos são depois levados pelos guardas.

Entra Giovanna que expressa não querer ser a causa da morte de Anna; entretanto chega Hervey que informa que os pares do reino anularam o matrimónio do rei com Anna, e que ela e os cúmplices foram condenados à morte. Os cortesãos e Giovanna imploram a clemência de Enrico e este pede a todos que abandonem os aposentos.

Na sua cela, o cansaço e a dor fizeram com que Anna perdesse a razão. Em delírio, recorda tempos passados com Percy. Este e Smeton são levados à cela de Anna e Smeton implora o perdão. Confusa por momentos, Anna pergunta ao pajem por que razão não toca a sua harpa. Momentos mais tarde, o som de um canhão assinala o casamento do rei com Giovanna. Anna, momentaneamente lúcida, amaldiçoa o casal real, orgulhosamente, caminha para o cepo de cabeça erguida.

Biografias

Giampaolo Bisanti | Direção Musical

Natural de Milão, Giampaolo Bisanti estudou direção de orquestra, clarinete, piano e composição no Conservatório Giuseppe Verdi daquela cidade, tendo-se graduado com a classificação máxima. Foi premiado por diversas vezes em concursos internacionais de direção musical tais como o “Dimitris Mitropolous” em Atenas (Presidente do Júri Sir Neville Marriner). Dirigiu Otello numa coprodução dos teatros da Lombardia, Stiffelio em Estocolmo, Turandot em Turim e Cagliari, La bohème no Teatro Carlo Felice em Génova, Madama Butterfly no Teatro La Fenice em Veneza e nos teatros da Lombardia, Cavalleria Rusticana e Madama Butterfly em Florença, Nabucco em Trieste, Lucia di Lammermoor em Génova, Il barbiere di Siviglia em Turim, Aida em Seoul e La traviata em Estocolmo. Na última temporada, estreouse na Oper Zurich dirigindo uma nova produção de La bohème, na Semperoper Dresden, também com La bohème, na Deutsche Oper Berlin com Rigoletto, no Teatro Nacional de São Carlos com a Messa da Requiem de Verdi e no Stadttheater St. Gallen com uma nova produção de Norma. Nesta temporada já tem confirmadas algumas estreias, como por exemplo, no Teatro Liceo de Barcelona com uma nova produção de Macbeth a inaugurar a temporada, no New National Theatre em Tóquio numa nova produção de Lucia di Lammermoor e um regresso à Deutsche Oper Berlin, desta vez para a ópera Aida. Desde novembro de 2016 que assume o cargo de maestro principal do Teatro Petruzelli de Bari.

Graham Vick | Encenação

É o Diretor Artístico da Birmingham Opera Company e colabora regularmente com as mais importantes casas de ópera do mundo e com os mais conceituados maestros. Graham Vick já encenou Wagner na Royal Opera House, Chausson em Paris, Verdi no La Scala, Mozart no Festival de Salzburgo, Monteverdi em Bolonha, Schoenberg e Chostakovich na Metropolitan Opera, Mussorgsky e Prokofiev no Mariinsky Theatre e Rossini em Pesaro. Assuas colaborações com compositores vivos incluem Un re in ascolto de Luciano Berio, no Covent Garden, Paris e Chicago, e Outis no La Scala, Timon of Athens de Stephen Oliver na English National Opera, Ghanashyam de Ravi Shankar, Life is a Dream de Jonathan Dove e Wednesday from Light de Karlheinz Stockhausen na Birmingham Opera Company e, mais recentemente, Morgen und Abend de George Friedrich Haas para a Royal Opera House. O trabalho de Graham Vick em Birmingham é considerado pioneiro na modernização da ópera e no seu desenvolvimento enquanto forma de arte do século XXI.

Elena Mosuc | Soprano

A romeno-suiça Elena Mosuc nasceu em Iasi, na Roménia, tendo aí estudado no Conservatório George Enescu. Antes mesmo de completar os seus estudos, foi premiada em diversos concursos internacionais. Desde o início da carreira que Elena Mosuc tem colaborado muito regularmente com a Zurich Opera House, tendo-se aí apresentado em papéis como Rainha da Noite, Konstanze, Donna Anna, Lucia di Lammermoor, Linda di Chamonix, Elvira, Gilda, Violetta, Luisa Miller, Sophie, Zerbinetta, Aminta/Timidia (The silent woman), Musetta, Micäela, Marguerite, Liù, Medora (Il Corsaro), Nedda, Mrs. Alice Ford, Olympia, Antonia e Giulietta. Tem sido muito frequentemente convidada a apresentar-se em importantes casas de ópera e festivais por todo o mundo, tais como em Barcelona, Berlim, Hamburgo, Munique, Viena, Salzburgo, Paris, Londres, Milão, Roma, Veneza, Verona, Bruxelas, Amesterdão, bem como nos Estados Unidos da América (Nova Iorque e Dallas), Japão e China. Trabalhou com alguns dos mais conceituados maestros como Nikolaud Harnoncourt, Christoph von Dohnanyi, Fabio Luisi, Lorin Maazel, Gustavo Dudamel e Daniel Harding e com os encenadores Franco Zeffirelli, Liliana Cavani, Ruth Berghaus, Sven-Eric Bechtolf, Stefan Herheim e Martin Kusej. Apresenta-se regularmente em concertos e em espetáculos de ópera no seu país natal. Nos últimos anos, Elena Mosuc tem vindo a estabelecer-se como um dos mais versáteis e expressivos sopranos da atualidade

Burak Bilgili | Baixo

Desde a sua estreia no Teatro alla Scala, em 2002, como Don Alfonso em Lucrezia Borgia, Burak Bilgili tem sido muito aclamado pelas suas atuações em diversos espetáculos em salas como a Metropolitan Opera de Nova Iorque, Carnegie Hall de Nova Iorque, Washington National Opera, San Francisco Opera, Seattle Opera, Opéra de Montreal, Canadian Opera em Toronto, Liceu de Barcelona, Grand Théâtre de Genève, Caramoor Festival, Savonlinna Festival, Maggio Musicale Fiorentino, em Florença, e Teatro dell’Opera di Roma, trabalhando com maestros como Gianandrea Noseda, Evenlino Pidò, Nicola Luisotti e Alberto Zedda. Dos compromissos mais recentes, destacam-se o Conte di Walter (Luisa Miller) na Staatsoper de Hamburgo, Zaccaria (Nabucco) no Teatro Lírico de Cagliari, Sparafucile (Rigoletto) na Omaha Lyric Opera, Colline (La bohème) na Naples Opera, Nourabad (Les Pécheurs de perles) na Miami Lyric Opera, Don Basílio (Il barbiere di Siviglia) na Canadian Opera Company e em La Coruna, papel principal em Don Pasquale na Cincinnati Opera, Banco (Macbeth) em Detroit e Nova Orleães e Laurent (Roméo et Juliette) na Atlanta Opera. Distinguido com vários prémios, formou-se pela Academy of Vocal Arts em Filadélfia e pelo Conservatory of Mimar Sinan University. Estudou com o maestro Bonaldo Giaiotti e Katia Ricciarelli e, atualmente, com o maestro Bill Schumann.

Ficha Artística

ANNA BOLENA
Gaetano Donizetti 

Libreto Felice Romani

 

Teatro Nacional São Carlos
4, 6, 9 e 14 de fevereiro às 20h00
12 de fevereiro às 16h00

 

Direção Musical Giampaolo Bisanti
Encenação Graham Vick

Cenografia e Figurinos Paul Brown

Desenho de Luz Giuseppe Di Iorio

 

Anna Bolena Elena Mosuc

Enrico VIII Burak Bilgili

Giovanna Seymour Jennifer Holloway

Lord Percy Leonardo Cortellazzi

Smeton Lilly Jørstad

Lord Rochefort Luís Rodrigues

Hervey Marco Alves dos Santos

 

CORO DO TEATRO NACIONAL DE SÃO CARLOS
Maestro titular Giovanni Andreoli

ORQUESTRA SINFÓNICA PORTUGUESA
Maestrina titular Joana Carneiro

 

Produção Fondazione Arena di Verona

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