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EDP compra coleção de arte de Pedro Cabrita Reis por 1,5 milhões de euros

Pedro Cabrita Reis começou a coleção em meados da década de 1990 [foto: Daniel Rocha]

Conjunto inclui 388 obras de 74 artistas portugueses e é visto como uma “grande mais-valia” para o museu que a elétrica promete inaugurar até ao fim do ano.

Até aqui estava guardada, longe de todos os olhares.As exposições de que fazia parte estavam todas na cabeça de Pedro Cabrita Reis, o artista plástico que a partir de meados dos anos 1990 começou a reunir a coleção que hoje inclui 388 obras de 74 artistas portugueses. Até ao final do ano, parte dela vai estar exposta no Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT) que a Fundação EDP vai inaugurar em Lisboa, junto à Central Tejo. E isto porque o artista plástico, há muito representado no acervo que a própria fundação tem vindo a construir nos últimos 15 anos, vendeu recentemente a sua coleção à elétrica por 1,5 milhões de euros.

A venda, que estava a ser negociada há cerca de um ano, ficou concluída em dezembro e permitirá à EDP reforçar a sua coleção e, ao mesmo tempo, a programação do novo MAAT, que quer ver transformado num “importante centro de arte contemporânea”, garante o diretor-geral da fundação, Miguel Coutinho. “Além de vir enriquecer o que já temos – agora passamos a dispor de um dos mais significativos acervos de arte contemporânea portuguesa da última década do século XX e da primeira do século XXI –, esta compra cruza-se com a ambição de fazer do futuro museu um pólo cada vez mais interessante para a criação nacional”, explica. “É uma grande mais-valia.”

A coleção de Cabrita Reis possibilitará ainda, explica a equipa de Miguel Coutinho por email, aumentar a lista de autores representados na coleção da fundação que, desde o seu arranque, em 2000, tem vindo a incorporar sistematicamente jovens artistas, nomeadamente no período contemporâneo pós-1968. A um universo de 225 criadores que incluía também referências como Helena Almeida, Ângelo de Sousa, António Palolo, José Pedro Croft, Lourdes Castro, Paulo Nozolino e Edgar Martins, somam-se agora 35 nomes – os de Augusto Alves da Silva, João Tabarra, João Louro, Hugo Canoilas, Vasco Costa, Jorge Nesbitt e Sílvia Hestnes Ferreira, entre tantos outros.

“É uma coleção importante, feita por um artista que esteve muito atento a outros artistas que surgiam à sua volta a partir dos anos 90”, diz Pedro Gadanho, o arquiteto que dirige a programação do MAAT. “Sendo um artista, Cabrita Reis estava muito próximo de todos estes nomes que saíam das escolas, conhecia muitíssimo bem o meio. E teve a perceção imediata, graças à sua sensibilidade, do potencial de cada um. Foi fazendo as suas compras sem as dificuldades que enfrentam os colecionadores institucionais que não trabalham com curadores e que se prendem com falta de visão e falta de rapidez para agir no mercado”, acrescenta este comissário que antes de vir ocupar o cargo de diretor do novo museu era curador no departamento de arquitetura e design do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA).

Efetivamente, Cabrita Reis já o reconheceu várias vezes a propósito da sua coleção, boa parte das compras foi feita quando os artistas estavam a sair da faculdade ou a participar nas suas primeiras exposições. “Hoje, são nomes que têm carreiras consolidadas, alguns deles até a nível internacional, como Joana Vasconcelos, Leonor Antunes e Vasco Araújo”, e por isso com outro peso no mercado, acrescenta Gadanho.

O tempo justo
Pedro Cabrita Reis (n. 1956), um dos mais importantes artistas contemporâneos portugueses, sempre teve a intenção de fazer uma coleção. A que em dezembro vendeu à Fundação EDP compõe-se, explica ao PÚBLICO por email, de obras de “artistas que têm um olhar assertivo sobre o mundo”. O facto de serem portugueses não foi determinante: “A questão da nacionalidade poderá ser relevante para alguns. Para mim não. O que me interessou sempre foram os indivíduos e a individualidade do seu olhar.”

Até aqui a coleção do artista nunca foi exposta como um todo, embora pontualmente Cabrita Reis tenha emprestado obras a pedido dos autores. A possibilidade de a mostrar parece ter pesado na decisão de a vender. E de a vender agora. “Uma coleção atinge a sua plenitude quando partilhada. Essa partilha deve ser feita no tempo certo, e da forma certa. O MAAT tem o conceito e o projeto ideal para acolher e mostrar a coleção que eu construí. Foi o momento justo para dar à minha coleção a visibilidade que os artistas que a integram merecem.”

O valor pelo qual a coleção foi vendida à fundação (1,5 milhões de euros), precisa o diretor-geral Miguel Coutinho, é inferior ao determinado por qualquer uma das três avaliações externas pedidas durante as negociações. António Gomes Pinho, presidente da Fundação Vieira da Silva; Jean-François Chougnet, ex-diretor do Museu Berardo; e Vicente Todolí, antigo diretor do Museu de Serralves, foram os peritos consultados, colocando o valor do acervo entre os 1,8 e os 2,4 milhões de euros. Por que aceitou Cabrita Reis alienar a coleção por uma soma inferior? A resposta é simples: “Eu não ‘aceitei’ nenhum valor por quaisquer razões subjetivas. Fiz uma transação e, como em qualquer outra transação de qualquer outra natureza, o valor envolvido resulta de um acordo estabelecido no interesse mútuo das partes.”

Fosse como fosse, para este artista plástico, o valor de uma coleção é, por natureza, sempre superior ao estabelecido pela avaliação ou ao que resulta da negociação, porque a esse montante referente ao património em si e ditado pelo mercado é preciso acrescentar “o valor do ‘olhar’” de quem a construiu.

“A postura do Pedro Cabrita Reis foi exemplar em todo este processo”, sublinha Coutinho, “orgulhoso” com o facto de poder vir a integrar um “tão grande e tão significativo conjunto de obras” na coleção da casa. É a primeira vez, ressalva, que a fundação faz uma compra desta natureza, mas isso não significa que esteja prevista uma mudança na política de aquisições, que entre 2000 e 2015 foi coordenada por João Pinharanda, crítico de arte e atual Adido Cultural junto da Embaixada de Portugal em Paris, e que tem apostado sobretudo na compra de artistas portugueses com relevo nos panoramas nacional ou internacional, que não estejam representados no acervo ou que tenham nele núcleos que valha a pena consolidar, sem esquecer a incorporação dos premiados pela fundação.

“O prémio jovens artistas tem permitido à fundação fazer uma espécie de prospeção, de mapeamento do território no que toca aos novos talentos”, identificando criadores com potencial, à semelhança do que fez Cabrita Reis, nota o diretor do MAAT, que substitui Pinharanda à frente das aquisições. Uma compra com a dimensão da que envolveu a coleção do artista plástico não está, no entanto, prevista para os “próximos anos”, reconhece Miguel Coutinho.

Preencher uma lacuna
A aquisição deste conjunto vai permitir à fundação preencher uma lacuna na sua coleção, composta por mais de mil obras, praticamente todas de artistas portugueses, admite Pedro Gadanho. Essa lacuna diz respeito precisamente aos anos 1990 e ao começo dos anos 2000, uma vez que a parte histórica do acervo – com trabalhos de Ana Vieira, Lourdes Castro, Jorge Martins, Noronha da Costa ou Jorge Pinheiro – está “consolidada”.

A coleção EDP, que agora recebe mais 1067 objetos artísticos (nas 388 obras que pertenciam a Cabrita Reis há várias séries, algumas com largas dezenas de itens), tem como início cronológico a década de 1960, e tem vindo a concentrar-se, nos últimos anos, nos talentos mais jovens.

Muito em breve, o artista plástico verá muitas das obras que pertenceram à sua coleção integradas em várias exposições do MAAT, cujo programa começará em junho de 2016, ainda nas salas renovadas da Central Tejo, e que a partir de setembro contará com um novo edifício projetado pela britânica Amanda Levete. No verão começarão as exposições temporárias regulares com base em núcleos temáticos da coleção da fundação, associando peças históricas a aquisições recentes. A segunda destas mostras, agendada para meados de 2017, vai centrar-se precisamente no conjunto reunido por Cabrita Reis, que dividirá o comissariado com Gadanho.

Separar-se deste acervo que reuniu nos últimos 20 anos não traz ao artista qualquer nostalgia: “Ao ter escolhido e comprado cada uma destas obras, elas passaram a fazer parte de mim. Todas e cada uma delas. Elas existem e crescerão com o olhar dos outros.” E a cada momento revelarão mais um pouco de um artista que assim justifica, com ironia, por que se considera um “colecionador disciplinado”: “Só faço o que gosto, só gosto de quem gosto, e só comprei aquilo de que gostava.”

 

 


por Lucinda Canelas, in Público | 14 de janeiro de 2016

Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público

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