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Uma Peça | Um Museu

S. Vicente atado à coluna

Em 1642, D. Rodrigo da Cunha, Arcebispo de Lisboa, deixou-nos uma interessante descrição do retábulo quatrocentista que se erguia sobre o altar de S. Vicente na capela-mor da Sé de Lisboa e que viria a ser apeado e substituído já no final do século XVII. Uma peça do Museu Nacional de Arte Antiga.


S. Vicente atado à coluna 
Nuno Gonçalves 
c. 1470
Têmpera e óleo (?) sobre madeira de carvalho
Aquisição, 1915 ou 1916
Inv. 1549 Pint

De acordo com tal descrição, o retábulo incluía uma urna com relíquias corporais de S. Vicente e era essencialmente composto por uma série de fiadas horizontais de painéis de pintura, a iconografia dessas pinturas ilustrando “vários milagres do santo, com os passos principais de sua vida e martírio”.

S. Vicente atado à coluna, sintética imagem pictórica de um dos passos do legendário martírio do santo, bem como o painel incompleto, também aqui exposto, representando um outro episódio do seu martirológio (S. Vicente na cruz em aspa), estavam originalmente integrados nesse programa retabular executado por volta de 1470. Dele fariam também parte os chamados Painéis de S. Vicente, grupo de seis pinturas com especial destaque nesta sala.

Segundo o histórico testemunho de Francisco de Holanda, na sua obra “Da Pintura Antiga” (1548), o autor deste retábulo foi Nuno Gonçalves, pintor régio de D. Afonso V desde 1450. Com base numa evidente homologia de modelos e processos criativos, os quatro painéis com representações de Santos que se agrupam na sala seguinte do percurso do museu são também atribuíveis à oficina de Nuno Gonçalves, muito embora não esteja esclarecido se o seu primitivo destino possa ter sido igualmente o retábulo de S. Vicente da Sé de Lisboa.

Este S. Vicente é uma obra de notável eloquência visual pela sobriedade expressiva e contenção narrativa da composição. O espaço da figuração é deliberadamente despojado e simplificado, concentrando o olhar no corpo ainda juvenil do mártir, habilmente modelado pela luz, que aguarda serenamente o martírio num ambiente de desamparada austeridade, marcando nesse contraste de isolamento monumentalizante da personagem o seu exemplo como testemunha inabalável da mensagem de Cristo. Trata-se da mais antiga representação de um nu na pintura portuguesa, traduzindo já uma particular sensibilidade aos valores renascentistas por parte da mais importante oficina portuguesa na 2ª metade do século XV.

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