"É de Cultura como instrumento para a felicidade, como arma para o civismo, como via para o entendimento dos povos que vos quero falar"

Roteiros

FIGURAS DE LISBOA (Roteiro 2)

Debaixo do Arco central da Praça do Comércio atentemos no próprio monumento. Projetado por Veríssimo José da Costa, tem esculturas de Calmels que representam grandes figuras portuguesas, Viriato, o herói arcaico da independência Vasco da Gama - o que abriu novos mundos ao mundo -, Nuno Álvares Pereira, o heroico condestável dos combates contra os espanhóis e o reconstrutor da cidade Marquês de Pombal, entre alegorias dos rios Douro e Tejo.

 

É exatamente na direção do Marquês que apontaremos o nosso destino, por isso comecemos o percurso pela Rua Augusta. A terceira transversal é a Rua da Conceição, das raras onde ainda passam os elétricos da cidade, e que é uma das poucas ruas da Baixa que continuou a tradição da organização por "mesteres" já que ainda hoje aí se concentram os retroseiros. Logo depois da esquina, no primeiro andar do n.º 93, podemos observar uma placa que indica o sítio exato onde nasceu o famoso poeta modernista Mário de Sá Carneiro (1890-1916) companheiro de Fernando Pessoa, preferiu Paris à capital portuguesa e nessas paragens escolheu morrer, muito novo, deixando atrás de si um rasto de génio e rebeldia.

Por entre o bulício de gentes diversíssimas ocupadas nos afazeres do consumo e dos negócios vamos encontrar ao fundo da Rua Augusta a grande praça da cidade que é o Rossio. No n.º 26 viveu e iniciou a sua vida literária Eça de Queirós (1845-1900), o romancista que passa incólume de geração em geração pelo génio e humor com que descreve o caráter português. Por baixo podemos entrar no famoso Café Nicola onde se invoca, em pinturas assinadas por F. Santos, datadas de 1935, a biografia do literato e boémio Bocage (1765-1805). Do lado direito, à entrada, um soneto regista o caráter do poeta pré-romântico: «Não sou vil delator» que tem como pendant «Olha Marília as flautas dos pastores»; segue-se a atitude política da interveniente figura pública do «Inimigo de hipócritas e frades», não podendo faltar uma das suas anedotas mais famosas ao responder a um ladrão: «Sou o poeta Bocage, venho do Nicola e vou para o outro mundo se disparas a pistola», vindo depois a saudade, «Faltou-me o grande Filinto...» e, finalmente, o retrato de um amigo com «Cara curta», o Dr. França.


Temos logo a seguir a Estação do Rossio, único monumento sebastianista construído em estilo neo-manuelino, mas com a referência indubitável e simbólica ao jovem rei D. Sebastião (1554-1581) que levou consigo a aristocracia da sua geração a morrer no areal de Alcácer Kibir por ter sonhado mais do que permitia o seu poder. No eixo central, e a pontuar os dois pórticos, quase à altura do comum dos mortais, vê-se a estátua do dito rei-menino. Estamos no Largo D. João da Câmara (1852-1908), e quase passa desapercebido o busto que lhe foi erigido no centro da praça por ter elevado à glória o teatro português. O Teatro Nacional à nossa frente tem o nome de um grande vulto das letras portuguesas, Almeida Garrett (1799-1854), que com os defeitos das suas qualidades foi um genial mal-amado que deixou atrás de si contraditórias memórias e uma obra ainda por explorar.

No n.º. 2 do Largo dos Restauradores todos os autores portugueses são referenciados de uma vez só, pois aí funcionou a primeira sede da Sociedade Portuguesa de Autores, instituição que foi uma referência de luta pela liberdade durante o salazarismo.

Carlos Botelho (1899-1982), o pintor de Lisboa, viveu no n.º 65 da Avenida da Liberdade, e um pouco mais acima, do lado esquerdo do grande boulevard da cidade, encontramos a homenagem aos Combatentes da Primeira Grande Guerra (1914-1918). Trata-se de uma grande estátua desenhada por Rebelo de Andrade e esculpida por Maximiano Alves que eterniza os feitos dos soldados que participaram na única guerra mundial em que Portugal entrou.

Mesmo por trás está o Palácio Lima Mayer, hoje Consulado de Espanha que foi o primeiro Prémio Valmor de arquitetura entregue a Nicola Bigaglia. Encontra-se paredes meias com o primeiro edifício moderno de Lisboa, o Capitólio do Parque Mayer riscado por Cristino da Silva. O Parque foi um lugar simbólico de prazer para os lisboetas na primeira metade do século e hoje é uma "cidade fantasma", à espera de novo sopro de vida.

Mas deixemo-nos de lamúrias já que mais à frente podemos encontrar em bom estado o Cinema São Jorge, do arquiteto Fernando da Silva, e também o Hotel Tivoli que durante anos foi a "casa" da famosa Beatriz Costa (1907-1996), estrela ímpar de um dos períodos de ouro do cinema português. No n.º 193, que faz esquina com a R. Barata Salgueiro, vê-se uma placa que homenageia Humberto Delgado (1906-1965) que, tendo começado por acumular cargos militares e civis no regime de Salazar, corajosamente assumiu a oposição ao regime quando se candidatou à Presidência da República em 1958, e sobretudo quando foi o herói do ataque ao paquete de luxo Santa Maria com que conseguiu atrair as atenções do mundo para o caso português. Na alameda que corre ao longo da Avenida encontramos o monumento a Rosa Araújo (1840-1893), o grande obreiro da urbanização que lançou Lisboa para Norte, para as chamadas "avenidas novas", para longe do rio à beira do qual durante séculos foi crescendo.

Onde a Avenida cruza com a Rua Alexandre Herculano vamos encontrar vultos da literatura nacional. De um lado, o próprio historiador e escritor Herculano (1810-1877) que deu o nome à rua e que, ao retirar-se para "Vale de Lobo", desiludido da política, criou um tipo que influenciou gerações pelo seu exemplo. Do outro lado António Feliciano de Castilho (1800-1875). Já agora que aqui estamos, e a título de curiosidade, espreitemos o edifício de uma empresa espanhola de construção civil que guarda neste momento a estátua de Luís de Camões retirada do seu Largo de origem, assim como outros vultos da literatura nacional do século XVI que fazem parte do monumento ao grande vate lusitano.

Finalmente chegamos à Rotunda do Marquês de Pombal pontuada ao centro pela gigantesca estátua erguida em honra do reconstrutor de Lisboa. Usando a passagem subterrânea do metropolitano, atravessemos para o lado contrário da Avenida e espreitemos a Avenida Duque de Loulé para homenagear a figura de Camilo Castelo Branco (1825-1890), escritor romântico de génio - quem não conhece "O Amor de Perdição"? - cuja vida aventurosa ultrapassa a própria ficção da sua obra.

Ao começar a descer a Avenida da Liberdade pelo lado Oriental, surpreende-nos à esquerda o edifício sede do Diário de Notícias. Entremos para nos regalarmos com os enormes frescos de Almada Negreiros (1893-1970) - artista polifacetado e de enorme talento que marcou várias décadas da cultura portuguesa na pintura, no teatro, na dança e na poesia - que representam um planisfério, uma alegoria a Portugal e a Imprensa. Do lado esquerdo está a estátua de Tomás Quintino Coelho, fundador do jornal. Continuando pela Avenida encontramos em paralelo às estátuas da Rua Alexandre Herculano, mais duas que celebram escritores, desta vez Almeida Garrett (1799-1854), o diplomata escritor de que já falámos e Oliveira Martins (1845-1894), uma referência da história política do acidentado fim de oitocentos português.

Um pequeno desvio vale a pena. Entremos na Rua Rodrigues Sampaio onde vamos encontrar o Hotel Britânia no n.º 17. Exemplarmente recuperado, guarda a memória da mulher do seu primeiro proprietário, a grande poetisa Natália Correia (1923-1993), que foi um furacão de talento em prol de uma cultura livre no pacato Portugal em que nasceu. O n.º 212 foi também Prémio Valmor, construído pelo arquiteto Norte Júnior (1878-1962) para o visconde de Salreu: é talvez dos mais belos edifícios da Avenida com o seu gosto cosmopolita de laivos afrancesados. Espera-nos uma inusitada surpresa no n.º 144, pois nas obras de construção de um moderno edifício de aço e vidro surgiu um marco do reconquistador da cidade, o rei D. Afonso Henriques. Ele lá está, sob a arcaria do pórtico, com a nau simbólica de Lisboa e os corvos, significativamente representados em posição contrária à habitual com os seus bicos virados para fora. Surpreendente é a descabida estátua erguida de Símon Bolivar (1783-1830) que, como todos sabemos, nada tem a ver com a história de Lisboa nem tão pouco com a de Portugal. Mas deixemos isso e prossigamos a nossa viagem. O palacete do n.º 24 ostenta na fachada bustos com os génios da humanidade. É de facto um programa assaz curioso de um iluminado da época. Assim, ao lado de Miguel Ângelo, vemos o humanista João de Barros, Vasco da Gama, Guttenberg, Galvani, Rousseau e Camões.
Novamente na alameda do meio, encontramos a estátua de Manuel Pinheiro Chagas (1872-1935) erigida com o subsídio da Sociedade Promotora de Portugal e Brasil. Na base do monumento, uma figura pode identificar-se com a Morgadinha de Val-Flôr.

Já de novo nos Restauradores, valerá a pena contemplar o que resta, ou melhor dizendo o esqueleto, do antigo Cine-Teatro Eden, obra prima da art deco em Portugal, e das maiores que saíram das mãos do arquiteto Cassiano Branco (1897-1970).

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