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40 anos de escrita de Teolinda Gersão

O livro “O Regresso de Júlia Mann a Paraty”, marca quatro décadas de carreira literária da escritora Teolinda Gersão. Em entrevista à Renascença, a autora revela que são a ‘paixão’, o ‘impulso’ e ‘uma maneira de estar viva’ que a motivam a escrever.

Foto: DR


É sempre a mesma paixão, o mesmo impulso” que 40 anos depois de se ter lançado na arte da escrita, continuam a motivar Teolinda Gersão para o labor de escrever histórias. A autora que venceu por duas vezes o Prémio Fernando Namora, está a lançar um novo livro, “O Regresso de Júlia Mann a Paraty” e ao mesmo tempo a apresentar a sétima edição da coletânea de contos “A mulher que prendeu a chuva e outras histórias”.

Em entrevista ao programa Ensaio Geral da Renascença, Teolinda Gersão começa por explicar que a “vontade de comunicar com os outros, sentir que tem coisas a dizer” faz com que continue a publicar aos 81 anos. Nas suas palavras, escrever “ é uma maneira de estar viva, de participar”.

No seu mais recente livro editado pela Porto Editora, há uma frase em que um dos personagens diz: “sou eu o livro que desde sempre escrevo”. Interrogamos a autora sobre se identifica com esta ideia. Teolinda Gersão considera que “todos os escritores se identificam com essa frase”.

Nas palavras da autora que nasceu em Coimbra, “todos os escritores escrevem um livro ao longo da sua vida, que são muitos livros. Alguns repetem-se um pouco”. Admite que gosta de fugir a essa repetição. “Eu não tenho um formato, nem quero ter. Gosto do imprevisto, de mudar, de reinventar. Não quero ser previsível. Vou escrevendo livros intencionalmente muito diferentes uns dos outros, o que me agrada, porque sinto que me reinvento e me renovo”, afirma.

Vencedora de vários, e importantes prémios, entre eles o Fernando Namora, o Grande Prémio do Conto Camilo Castelo Branco ou o Vergílio Ferreira em 2017, Teolinda Gersão confessa ser muito exigente com a sua escrita.

“Posso demorar cinco anos a escrever um livro. Também pode ser um processo muito mais rápido . Mas sou muito exigente com a minha escrita e comigo própria. Só publico um livro quando digo, ‘isto é o melhor que eu sei fazer’ e tal como está, acho que está bem. Depois público e logo se verá o que acontece, o livro segue o seu rumo”.

O livro que agora dá aos seus leitores revela também a geografia desta autora que foi leitora de português na Universidade de Berlin, na Alemanha e que, por circunstâncias da sua vida pessoal, viveu dois anos no Brasil.

“O Regresso de Júlia Mann a Paraty” apresenta três pequenas novelas que se cruzam e onde Teolinda narra a história da relação de figuras reais, como Freud e Thomas Mann, mas também conta a vida de Júlia Mann, a mãe de Thomas e Heinrich Mann, que tinha origem brasileira.

O livro reflete muito do pensamento da época, diz a autora a quem interessou detalhar a vida de Júlia Mann, uma mulher que sentiu na pele o peso do preconceito. “Ela teve uma vida infelicíssima e dificílima, porque era considerada inferior por ser mestiça, sul americana, por não ser alemã. Eles consideravam isso uma mancha, o que não deixa de ser ofensivo, mas ao mesmo tempo, muito característico do pensamento europeu da primeira metade do século XX. Havia essa ideia eurocêntrica que era um preconceito arreigadíssimo e esse aspeto interessou-me”, conta Teolinda Gersão ao Ensaio Geral.

A figura da mulher é de resto um dos epicentros da obra escrita da autora de “A Árvore das Palavras”. Em declarações a partir de sua casa, a escrita inúmera aqueles que considera serem os temas que marcaram estes 40 anos de escrita: “A figura da mulher na sociedade patriarcal, masculina, feita contra ela. A luta pela emancipação das mulheres, pela sua própria personalidade, a solidão, a falta de comunicação entre as pessoas, as desigualdades sociais, a fome, a injustiça”.

Diz Teolinda Gersão são temas que a “preocupam”. Considerando que os escritores mais jovens são hoje menos politizados, em comparação com os autores da sua geração, a escrita refere que escreve “quando as coisas tocam, magoam e ferem”.

“Há sempre um lado emocional. A minha geração viveu muito. Vivi os primeiros 34 anos debaixo de uma ditadura. Tinha de falar de como era viver em ditadura, no segundo livro “Paisagem com Mulher e Mar ao Fundo”. Depois houve o 25 de abril, houve uma mudança enorme, mas chegamos a hoje e não estamos satisfeitos, nem felizes com aquilo que conseguimos”, afirma de forma crítica Teolinda Gersão.

“Estamos cansados de estar na cauda da Europa, da corrupção que graça de uma maneira escandalosa , de que a justiça funcione pouco e muito mal. Estamos indignados e frustrados. Continuamos a lutar por uma vida melhor para os nossos filhos e netos, para as gerações futuras”, diz nesta entrevista.

A arte da escrita é um espaço também para mudar os paradigmas considera Teolinda Gersão. “O mundo que temos não nos serve, não nos satisfaz. É um mundo de guerra, de ódio, de violência, ganância, exploração, de esmagamento das massas por um pequeno número de poderosos e gananciosos que não têm valores, que destroem o que há de humanista na nossa cultura. O sistema bancário precisa de ser alterado, mas os interesses instalados, recusam fazer isso. Há muita coisa a transformar e eu faço parte daqueles que participam como podem na luta para que alguma coisa aconteça e mude para melhor”.


por Maria João Costa in Renascença | 5 de fevereiro de 2021
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Rádio Renascença

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