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Nesta exposição somos todos contaminados pelo som das palavras

Exposição antológica do artista britânico Tris Vonna-Michell está no Centro de Artes Visuais, em Coimbra, até dia 4 de julho.

Um dos aquários de Vessel: Yorktown Express (2017), com uma série de objetivas inutilizáveis Cortesia: Centro de Artes Visuais, Coimbra


Nos dias que acompanharam a queda do muro de Berlim, a Stasi entrou em furor destrutivo. A polícia secreta da Alemanha de Leste procurou eliminar grande parte do seu acervo documental rasgando-o para, depois, o queimar. Uma sucessão de acontecimentos fez com que apenas a primeira fase da empreitada fosse levada a cabo. Em 2007, o diário britânico The Guardian publicava uma reportagem sobre o E-Puzzler, o programa informático que prometia acelerar o doloroso processo de reconstituir manualmente, pedaço a pedaço, os documentos. Até então, tinham sido possível recuperar o equivalente a 350 sacos, escrevia o jornal, mas faltava ainda dar sentido a 16 mil sacos de fragmentos.

Há uma certa ironia na obra de Tris Vonna-Michell, o artista britânico que tem no Centro de Artes Visuais (CAV, Coimbra) a exposição No More Racing in Circles – Just Pacing Within Lines of a Rectangle, com curadoria de Ana Anacleto. Numa lógica circular, o recorte dessa reportagem do diário britânico é ele mesmo um fragmento, no meio de uma parafernália disposta por trás de uma vitrine em Chopin (Alma Verse), uma instalação de 2018 que é complementada com uma projeção analógica e áudio.

A instalação é um dos elementos desta antológica do trabalho de Tris Vonna-Michell, britânico de 39 anos que vive na Suécia e em 2014 foi nomeado para o Prémio Turner, que tomará conta do Pátio da Inquisição até 4 de julho, integrada no Museu das Obsessões, um ciclo de oito exposições que Ana Anacleto tem vindo a desenhar para o CAV.

“O ciclo prevê esta ideia de convocar para o espaço do CAV uma série de artistas que trabalham e produzem investigação no domínio das artes visuais, usando as imagens de diferentes formas”, diz a curadora ao PÚBLICO. É nesta série, que começou com a exposição Spectrum (2020), formada a partir da coleção dos Encontros de Fotografia, que surge Tris Vonna-Michell, artista já com presença no espaço nacional, na Galeria Francisco Fino e na Appleton Square. “Esta é a primeira vez que estamos a mostrar uma seleção abrangente do seu trabalho”, sublinha Ana Anacleto.

Para Vonna-Michell “a imagem é um suporte material e materializável”, refere a curadora, chamando a atenção para o facto de o artista trabalhar com objetos que roçam a obsolescência, dificilmente utilizáveis em 2021 e cuja apresentação é, em si mesma, uma exposição. “Podemos tentar utilizá-los [os equipamentos], mas é preciso recuarmos tecnologicamente para o conseguirmos.” Essa vertente é também um capítulo “da história da imagem e da nossa relação com a imagem”, acrescenta.

Encontramos essa relação nas obras projetadas através de equipamentos arcaicos ou em Vessel: Yorktown Express (2017), dois aquários com uma pilha de lentes de molho, montada a partir de uma encomenda de “um número gigante de objetivas” que correu mal. Estavam estragadas, inutilizáveis. A peça acaba por funcionar como uma espécie de “arqueologia de dispositivos óticos”, explica Ana Anacleto.

O som e a temperança 

É uma cacofonia propositada que nos introduz a No More Racing in Circles – Just Pacing Within Lines of a Rectangleexposição que pede o título emprestado à última obra publicada do artista, em 2019, uma reflexão sobre o impacto de interpretar várias narrativas num curto espaço de tempo ao longo de vários anos. O som dessas histórias acompanha vários dos dispositivos multimédia da exposição, formando um coro de murmúrios, “uma contaminação propositada”, nota a curadora.

Subindo ao primeiro piso do CAV, numa área mais dedicada a trabalhos experimentais, está a Temperança e o Louco, de Catarina de Oliveira (n. 1984), que tem as mesmas datas de exibição que o vizinho de baixo. “Para expor neste espaço, não é uma condição que o trabalho seja novo, mas a Catarina propôs-me isso”, diz Anacleto. A artista parte do baralho de tarot para elaborar peças – panos pintados com pigmentos naturais – que correspondem a cada carta. A série começa com as cartas 0 e 14: O Louco e a Temperança. “O trabalho da Catarina convoca estes universos do esoterismo, uma serie de práticas que tem na vida corrente.”

As duas exposições fecham o capítulo do espectro do Museu das Obsessões, ao passo que as próximas inauguram a reflexão sobre a vertigem.


por Camilo Soldado in Público | 23 de maio de 2021
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público

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