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Francisco Pinto Balsemão (1937-2025)
O Centro Nacional de Cultura homenageia o seu associado e amigo Francisco Pinto Balsemão, membro do júri do Prémio Europeu Helena Vaz da Silva.
Referência de Democracia, defensor do Estado de direito e da liberdade de imprensa, é um dos fundadores do regime constitucional português. Não é possível compreender a nossa história contemporânea – desde a transição democrática à revisão constitucional de 1982, continuando pela criação do Expresso e da SIC – sem a sua presença e a sua coerência. O CNC envia sentidas condolências a familiares e amigos.
O pequeno Francisco cresceu na companhia dos pais, no coração do bairro lisboeta da Lapa, na Rua Ribeiro Sanches nº 63 – a dois passos da atual sede do partido pelo qual chegaria à chefia do Governo, o PSD, na S. Caetano à Lapa. As primeiras letras aprendeu-as em casa: só foi à Escola Primária da Rua do Machadinho para fazer o exame da 4.ª. A passagem à adolescência foi vivida no Liceu Pedro Nunes.
Os pais puxavam por ele, contou mais tarde numa entrevista ao Expresso, e fizeram um drama no único período letivo em que não esteve no quadro de honra – dos sete anos em que frequentou o liceu.
E a fazer por ganhá-lo. Ainda andava no Pedro Nunes quando fez uma edição fotocopiada dos apontamentos que tirava nas aulas de Literatura para vender aos colegas. Por essa altura também começou a fazer traduções para o vespertino Diário Popular, propriedade de um tio homónimo.
Com o serviço militar cumprido e o curso de Direito, tornou-se advogado em part-time, ao mesmo tempo que entrava para o Diário Popular como secretário da direção de Martinho Nobre de Melo, em 1963. Em 1965, por morte do pai, acionista minoritário do jornal (16%), Balsemão sucedeu-lhe no Conselho de Administração. Fazendo jus ao nome, o Popular apostava num jornalismo mais próximo dos leitores, afastando-se do cinzentismo oficioso da concorrência. Uma das secções mais lidas era a coluna social Bisbilhotices, assinada por Vera Lagoa. Resultado: “Chegámos a ultrapassar o DN, na casa dos 130 mil [exemplares por dia]. E havia O Século, a vender 80 ou 90 mil, o Diário de Lisboa, A Capital e os jornais do Porto, que eram bons negócios e vendiam.”
O êxito do Diário Popular despertou apetites. Em 1971, o grupo Quina (Banco Borges & Irmão) comprou o jornal por 200 mil contos (um milhão de euros), uma fortuna para a época. Francisco Balsemão ficou com um pé-de-meia de mais de 30 mil contos (150 mil euros). O fundo de maneio em que assentaram os alicerces do Expresso.
Como em muitos da sua geração, a primeira experiência política de Francisco Balsemão foi a campanha do general Humberto Delgado para as eleições presidenciais de 1958. “Vi a polícia a bater e não gostei”, dirá na entrevista que assinalou os 40 anos do Expresso, em janeiro de 2013.
Foi o despertar de uma consciência política complementada pela leitura de Sartre, estimulada por uma namorada que teve aos 24, 25 anos. O curso de politização foi desenvolvido no Diário Popular, onde conviveu com jornalistas que tinham sofrido na pele a sua oposição ao regime, caso de Mário Ventura Henriques, militante comunista – e onde era “massacrado todos os dias” pela Censura.
Balsemão acabou por fazer umas visitas forçadas à sede da polícia política, por causa da página de turismo do Popular, que partilhava com um jornalista “marcado” pela PIDE. “Tive dois interrogatórios, o segundo dos quais durou para aí oito horas.” O máximo que lhe fizeram foi ameaçar que o prendiam.
Em 1968, Salazar caiu da cadeira e Marcello Caetano sucedeu-lhe na Presidência do Conselho de Ministros. O novo chefe do Governo iniciou o seu mandato num “estado de graça” alimentado por todos – e eram muitos – quantos acreditavam na iminência da abertura do regime.
Nunca se soube se o próprio Caetano acreditou na “primavera marcelista”. Mas a verdade é que, com a aproximação das eleições legislativas de 1969, o presidente do Conselho fez questão de reservar, nas listas da União Nacional, uma quota de lugares na futura Assembleia Nacional. Para os ocupar convidou um grupo de quadros, quase todos jovens, não filiados no partido único e conhecidos por defenderem a liberalização do sistema político, com os olhos postos na Europa desenvolvida.
O chefe de fila desta “ala liberal” era o advogado de Cascais José Pedro Pinto Leite, antigo dirigente da associação de estudantes da Faculdade de Direito de Lisboa e presidente da Câmara de Comércio Luso-Alemã. Dela faziam parte, entre outros, o advogado portuense Francisco Sá Carneiro; o bastonário da Ordem dos Médicos, Miller Guerra; o jovem jurista açoriano Mota Amaral; Joaquim Magalhães Mota – outro advogado; e o administrador do Diário Popular Francisco Pinto Balsemão. Este colocou condições: queria ver garantida a independência – nomeadamente em relação ao Governo – que teria no exercício do novo cargo. Recebidas essas garantias, aceitou incluir o seu nome nas listas de candidatos, “até porque tinha o Zé Pedro Pinto Leite, um dos meus heróis no Pedro Nunes, guarda-redes da equipa de futebol”.
Quando a X Legislatura do Estado Novo iniciou os trabalhos, em 1969, os deputados sentaram-se no hemiciclo, como de costume, por ordem alfabética. Lado a lado na bancada ficaram dois parlamentares da nova “ala liberal”: Francisco José Pinto Balsemão, 32 anos, eleito pela Guarda, e Francisco Manuel Sá Carneiro, 35 anos, do Porto. Não se conheciam, tornaram-se amigos.
Menos de um ano depois, em julho de 1970, Pinto Leite, de 38 anos, morreu num desastre de helicóptero durante uma visita de trabalho à Guiné. Sá Carneiro sucedeu-lhe como líder informal da “ala liberal”.
Eleito secretário da Comissão de Negócios Estrangeiros da Assembleia, Balsemão interveio no plenário discutindo medidas tendentes ao desenvolvimento da região de turismo da Serra da Estrela e fazendo perguntas ao Governo sobre a conservação da estrada nacional entre as Penhas da Saúde e Seia. O deputado começava por defender os interesses do círculo que o elegera para S. Bento.
Mas ainda na 1.ª Sessão Legislativa (1969-1970) passou a ocupar-se de temas quentes da política nacional: fez perguntas sobre a provável data de envio à Assembleia da anunciada proposta de lei de imprensa. Num aparte a uma intervenção de Sá Carneiro, protestou contra os cortes feitos pela Censura nos relatos da imprensa relativos a uma sua intervenção anterior. Estava constituída a dupla Sá Carneiro-Pinto Balsemão que iria dar que falar nos anos seguintes.
Na sessão legislativa de1970-1971, Balsemão subscreveu, com Sá Carneiro e outros membros da “ala liberal”, um projeto de revisão constitucional. Foi uma lufada de ar fresco no caduco “parlamento” do Estado Novo. O documento continha propostas pouco menos que subversivas: se fosse aprovado, consagraria a efetivação das liberdades públicas e dos direitos e garantias individuais. Isto é, visava reformar o regime a partir de dentro, criando condições para uma transição democrática. Por outras palavras: estava condenado ao chumbo.
Apesar disso, Balsemão empenhou-se na discussão da proposta de revisão constitucional do Governo e dos projetos de outros deputados. Apresentou uma proposta de emenda à lei sobre liberdade religiosa e interveio sobre a proposta de lei de proteção do cinema nacional e da atividade teatral.
Ainda em 1971 foi co-autor, com Sá Carneiro e os “suspeitos do costume”, de um projeto de lei de imprensa onde era defendida a abolição da Censura e a autonomia e responsabilidade das redações. Não passou.
Em janeiro de 1972, Balsemão, Sá Carneiro e José Correia da Cunha visitaram os presos políticos em Caxias. Na sequência dessa visita, aqueles deputados denunciaram as condições de detenção a que estavam sujeitos os presos políticos à guarda da Direção-Geral de Segurança (DGS, o novo nome da PIDE) e apresentaram uma proposta de inquérito à atuação daquela polícia política. Foi um escândalo em S. Bento.
A 4.ª sessão legislativa foi breve para a maior parte dos deputados da “ala liberal”. Balsemão ainda participou no debate sobre os meios de comunicação social, preconizando a criação de leis da rádio e da televisão. Mas a “primavera marcelista” chegara ao fim. Depois de se perder num labirinto de hesitações, Marcello Caetano optou pela continuidade.
A reação dos ultras da Assembleia, torpedeando todas as propostas da “ala liberal”, provara que o regime era irreformável. No início de 1973, Sá Carneiro e Balsemão bateram com a porta.
Os 30 mil contos (150 mil euros) arrecadados por Francisco Balsemão com a parte que lhe coube da venda do Diário Popular ao Grupo Quina, em 1971, serviram para lançar um jornal diferente de tudo o que então se publicava em Portugal. A 6 de janeiro de 1973 saiu o primeiro número do Expresso, inovador logo na manchete da edição inaugural: “63% dos portugueses nunca votaram”.
A notícia tinha por base uma sondagem – outra novidade na imprensa portuguesa.
O semanário, que trazia o nome do proprietário no cabeçalho como diretor, seguia o modelo do jornalismo britânico, dando prioridade às notícias políticas e uma importância crescente à opinião.
A referência principal do comentário político era Sá Carneiro, autor habitual da coluna Visto, na página 2. Logo no n.º 5 do Expresso, o colunista foi notícia de primeira página, com foto e grande destaque: “Sá Carneiro já não é deputado.”
Os comentadores – Balsemão passou também a assinar o Visto – pisavam deliberadamente o risco, “esticando-se” para ver até onde conseguiam fazer recuar os limites da Censura. Outra das secções lidas com mais voracidade era a Gente, feita de notícias curtas, quase sempre personalizadas, recheadas de recados nas entrelinhas, mesmo ao gosto do atual Presidente da República, que entrara para o jornal como administrador-delegado. O antigo porta-voz de Marcello Caetano, Pedro Feytor Pinto, recorda, no seu livro de memórias Na Sombra do Poder, que “os principais alvos” do lápis azul eram “em especial o Ponto de Vista, escrito, primeiro, por Francisco Sá Carneiro, e depois, por Francisco Pinto Balsemão, ou a Gente, que se sabia ter várias autorias mas, em especial, a verve sibilina do Marcelo Rebelo de Sousa”.
Inovadora era também a importância concedida ao noticiário de sociedade – incluindo o mundo do trabalho: a manchete do n.º2 foi “Duzentos mil empregados de escritório querem sindicato único” – e de economia, com destaque para a bolsa e os negócios, e a forma mais arejada como era tratada a cultura.
Através da embaixada britânica, Balsemão arranjou estágios no Times e no Sunday Times, para onde enviou o chefe de redação, Augusto de Carvalho (futuro diretor, em 1982-1983), e o responsável pela Economia, Fernando Ulrich.
O futuro banqueiro assinava as peças sobre a Bolsa com o pseudónimo Vicente Marques e também estava na mira da Censura, de acordo com o testemunho de Pedro Feytor Pinto: era “alvo de cortes, tantas vezes difíceis de compreender”.
Quando foi a Inglaterra agradecer ao dono daqueles prestigiados jornais londrinos, Lord Thompson um dos grandes patrões da imprensa na época, Balsemão recebeu uma resposta simples ao seu discurso cheio de grandes princípios em louvor da liberdade de imprensa: ‘Are you making money?’ Recordou mais tarde: “Tinha toda a razão. Sem dinheiro fica-se refém dos bancos.”
O relacionamento burocrático com a Censura tinha consequências cada vez mais graves para o funcionamento do semanário. A título de exemplo, o jornalista José Pedro Castanheira fez um apanhado dos cortes sofridos só na edição de 1 de setembro de 1973 (O que a Censura cortou). Do extenso rol fazem parte notícias sobre os generais Bettencourt Rodrigues, Kaúlza de Arriaga e Spínola; sobre o industrial António Champalimaud; uma notícia de primeira página revelando que pilotos da Força Aérea tinham sido treinados nos EUA; a grande reportagem sobre a África do Sul; noticiário sobre as atividades da oposição (decorria a campanha para as eleições legislativas de 1973); breves sobre a apreensão dos livros Z, de Vassili Vassilikos, e Os Reinegros, de Alves Redol; e ainda vários artigos de opinião, incluindo o editorial.
Um desses textos – totalmente cortado – era o comentário de Mário Neves (antigo diretor do Diário de Lisboa e futuro embaixador de Portugal em Moscovo, a seguir ao 25 de Abril) a um artigo de Pinto Balsemão intitulado “Um problema chamado Ultramar”, que escapara às malhas dos censores graças à autorização dada pelo diretor dos Serviços de Informação (e porta-voz de Marcello Caetano).
Pedro Feytor Pinto conta nas suas memórias como acabou por assumir essa responsabilidade. “A partir de certa altura, o Marcelo Rebelo de Sousa começou a telefonar-me, pedindo a decisão, pois precisava de entrar nas máquinas. Como nada chegasse do Exame Prévio [o novo nome da Censura], cerca das 19:30, quase no prazo limite, disse ao Expresso para publicar tudo sem qualquer corte. Talvez meia hora mais tarde, telefonou-me o diretor de serviços do Exame Prévio (…) ‘Temos aqui um problema.’ Confirmou que o artigo do Expresso devia ser cortado, ao que eu retorqui que já lera o artigo e que dera indicações ao jornal sobre a liberdade de publicação. Disse-me não estar de acordo, ao que lhe respondi que estando todos de férias [era agosto], eu exercia funções hierarquicamente superiores pelo que a decisão já fora tomada”.
O texto agastou o chefe do Estado, Américo Tomás, e o chefe do Governo. Marcello Caetano chamou Feytor Pinto e, com o Expresso na mão, disparou: “Diz-me o Sr. Presidente da República ter sido você quem autorizou a publicação deste artigo do Balsemão.” O porta-voz lá conseguiu justificar-se. Mas a retaliação não se fez esperar.
O jornal passou a ter de entregar provas de página individuais. Balsemão recordou: “Mandávamos e eles cortavam cinco linhas ou mais, e tínhamos de refazer a página por causa dos espaços em branco e voltar a mandá-la.” O jornal fechava cada vez mais tarde e os prejuízos avolumavam-se. “Se não tivesse chegado o 25 de Abril, o jornal tinha acabado”.
Na madrugada de 25 de abril de 1974, uma quinta-feira, Francisco Balsemão andou pelo Terreiro do Paço a observar as movimentações dos militares revoltosos e seguiu para a redação do Expresso, na Rua Duque de Palmela, ao Marquês de Pombal, onde passou o dia em contactos febris. Mas não era só a edição desse sábado que o preocupava. A sua vida – e a de todos os portugueses – não seria a mesma depois do golpe de Estado. Muitos dos telefonemas que fez e recebeu nas horas seguintes tiveram como interlocutor Sá Carneiro, que, no Porto, insistia em saber todos os pormenores da revolução. Os dias que se seguiram foram vertiginosos. No dia 29 à noite, em entrevista ao telejornal, Sá Carneiro avançou a ideia da formação de um novo partido.
Balsemão ligou-lhe a perguntar se estava a falar a sério. O amigo confirmou e, a 3 de maio, os dois almoçaram com Magalhães Mota e Miller Guerra. Os quatro veteranos da “ala liberal” foram depois apresentar-se a Spínola, presidente da Junta de Salvação Nacional, como fundadores de um partido inspirado na social-democracia nórdica, posicionado no centro-esquerda do xadrez político.
Mas a conversa com Spínola azedou a propósito de África. O futuro Presidente da República insistiu no seu projeto federalista que manteria as colónias ligadas à “metrópole”, como defendera no livro Portugal e o Futuro, que acelerara a queda do regime anterior. Miller Guerra partiu a loiça: para ele a única solução era a independência imediata. Spínola nem queria ouvir falar na “entrega do Ultramar”. Sá Carneiro disse que era um assunto que precisava de ser discutido.
Os quatro voltaram para a sede do Expresso. Minutos depois, o núcleo duro estava reduzido a três: Miller Guerra saiu ainda antes da criação do partido que ajudara a fundar. A apresentação pública da nova força política ficou marcada para 6 de maio de 1974, no telejornal da RTP (a única estação televisiva). Horas antes, soaram os alarmes: o nome “social-democrata” tinha sido ocupado. A 5 de maio foi divulgado o manifesto do Partido Cristão Social-Democrata (PCSD), lançado por militantes da Ação Católica.
A poucas horas de apresentarem o novo partido, os fundadores tiveram de procurar uma alternativa. No gabinete de Balsemão, onde estavam também Magalhães Mota e Marcelo Rebelo de Sousa, sucediam-se os telefonemas para o escritório de Sá Carneiro, no Porto. Frenéticos, iam descartando hipóteses sucessivas, até que bateu à porta Ruben Andresen Leitão. Perante a angústia dos companheiros, o escritor mais conhecido por Ruben A. fez uma sugestão: Partido Popular Democrático. Não consta que tivessem exclamado “eureka!” mas podiam bem tê-lo feito. Como o PCSD nunca chegou a ser legalizado, a “marca” PSD ficou disponível; no entanto, só em 1976 o PPD adotou o nome de Partido Social Democrata e a sigla PPD/PSD, que ainda hoje consta no registo do Tribunal Constitucional. Pouco depois foi preciso escolher o símbolo e a cor.
Pedro Roseta (um histórico do PPD) escreveu num dos primeiros números do jornal do partido, Povo Livre, um artigo em que explicava que nos anos 30, na Alemanha, membros do partido social-democrático riscavam com setas, a giz, as suásticas pintadas nas paredes pelos nazis. Estilizadas (pelo cartunista Augusto Cid), passaram a simbolizar os valores da liberdade, igualdade e solidariedade. Para marcar a diferença em relação ao vermelho dos socialistas, comunistas e da extrema-esquerda, o PPD adotou como cor o laranja. A sugestão foi de uma prima de Balsemão, militante da primeira hora, e futura secretária de Sá Carneiro, Conceição Monteiro.
O site do PSD diz que a escolha se deveu ao facto de ser uma cor “quente e mobilizadora”. Na altura, constou que Conceição Monteiro lembrou – e bem – que o laranja iria ganhar nos meses seguintes uma popularidade imbatível: fora escolhida pelos estilistas internacionais como a cor da moda para a primavera-verão de 1974.
Na divisão de tarefas entre os novos dirigentes, Balsemão ficou com o pelouro da política externa, uma área para a qual se sentia especialmente vocacionado. Foi esse o tema da sua intervenção logo na primeira conferência de imprensa do PPD, a 8 de maio de 1974, e foi também esse o seu papel no “governo-sombra” formado por Sá Carneiro já nos últimos anos da década, antes da coligação com o CDS e o PPM, a Aliança Democrática (AD) que haveria de levá-lo ao governo.
Uma das suas primeiras missões foi votada ao fracasso: a adesão do PPD à Internacional Socialista (IS). Apesar dos elogios rasgados à social-democracia nórdica e da consagração dos princípios ideológicos social-democráticos no programa do partido, a marcação cerrada imposta pelo PS deixou sempre o PPD à porta da organização que reunia os partidos social-democratas, socialistas e trabalhistas. Nem o exemplo da Itália, representada na IS pelo PSI e pelo PSDI, foi tido em conta. Perante a barragem montada por Mário Soares, Balsemão viu-se forçado a reconhecer que não havia “nada a fazer”.
Já na frente interna, o apoio ao secretário-geral Sá Carneiro – era essa designação inicial do líder do partido, à semelhança do que sucedia (e se mantém ainda hoje) no PS e no PCP – arrastou Balsemão para o centro da primeira de muitas lutas pelo poder. Na noite de 25 de outubro de 1974, o PPD fez o seu primeiro comício no Pavilhão dos Desportos, em Lisboa. Casa cheia, um êxito. Mas depois do banho de multidão veio uma autêntica noite das facas longas, na sede do partido, à Avenida Duque de Loulé: uma reunião da Comissão Política em que rebentaram as hostilidades entre o grupo de Jorge Sá Borges e o líder do partido. O pretexto fora um conjunto de medidas tomadas pelo (então) sá-carneirista Magalhães Mota enquanto ministro do governo provisório, mas logo vieram à baila as fugas de informação que permitiam que não só as decisões mas também as discussões internas dos órgãos de cúpula do PPD aparecessem estampados nas páginas do Expresso. As atas da Comissão Política deixaram de ser distribuídas aos seus membros – mas nem por isso o jornal deixou de publicar informação privilegiada do partido do diretor. Quanto a Sá Borges, saiu do PPD meses depois.
O nome de Francisco Pinto Balsemão está no cabeçalho de uma edição histórica do Expresso. A 27 de abril de 1974, o semanário saiu pela primeira vez livre da Censura. Nos meses seguintes, o diretor portou-se como um timoneiro em plena tormenta. A política foi aquecendo até que entrou em ebulição no período que passou à história como o “processo revolucionário em curso” (PREC).
Balsemão desdobrava-se no desempenho de três papéis: dirigente político, jornalista e patrão. Neste último, não facilitava. Embora as vendas disparassem e a publicidade, até março de 1975, trouxesse boas receitas, as normas de austeridade que impunha na casa raiavam a caricatura. Maria João Avillez, que começou a trabalhar no Expresso no verão de 1974, lembrou, num perfil escrito para o Observador em março de 2016, a diretiva que recebeu de viva voz no gabinete do diretor-patrão: “Aqui escreve-se sempre dos dois lados do papel de máquina… É para poupar.” A imagem de forreta ficou-lhe colada à pele.
À medida que o poder, repartido entre os oficiais do Movimento das Forças Armadas (MFA) e os sucessivos governos provisórios, derrapava sempre mais para a esquerda, o Expresso e em especial o seu diretor – com quartel-general no primeiro andar do prédio da Rua Duque de Palmela, à esquina com a Braamcamp – tomavam parte ativa nos acontecimentos que relatavam. A certa altura, as notícias sucediam-se a um ritmo de tal modo alucinante que se tornou impossível manter a periodicidade semanal.
Durante alguns meses, na fase mais radical do PREC, o jornal passou a ter mais uma edição, à quarta-feira: o Expresso Extra. Balsemão, o jornalista, recebia quase todos os dias na redação repórteres enviados pelos mais prestigiados órgãos de comunicação europeus e americanos, que procuravam ajuda para desembaraçar o novelo de linhas contraditórias com que se cosia a revolução portuguesa. Uma dessas visitas foi a jornalista italiana Oriana Fallaci, célebre pela acutilância das suas entrevistas com os protagonistas da alta política mundial, desde o secretário de Estado americano Henry Kissinger ao palestiniano Yasser Arafat, passando pelo general vietnamita Giap, vencedor de duas guerras. Fallaci viera a Lisboa entrevistar o homem do momento, Álvaro Cunhal, e fora ter com Balsemão para lhe contar que acabara de obter do líder comunista a declaração de que não havia possibilidade de Portugal ter uma democracia parlamentar à maneira ocidental. O PCP apressou-se a acusar Fallaci de ter feito uma “grosseira deturpação” das palavras de Cunhal. Mas a italiana garantiu a exatidão da tradução e prontificou-se para divulgar as cassetes da entrevista.
Sempre apressado, o patrão era o primeiro a chegar à redação e o último a sair. O jornal vendia como pãezinhos quentes: depois da ocupação do República passou a ser, com o Jornal Novo, dirigido por Artur Portela Filho, um dos raros oásis de resistência à “cassete” debitada pelo resto da imprensa, “ao serviço da aliança Povo-MFA”.
No Expresso, Balsemão geria com cautela cirúrgica outra aliança: a que permitiu manter a funcionar um jornal em que a maioria da redação alinhava com a extrema-esquerda, enquanto a direção tinha uma agenda política diametralmente oposta. Era “quase uma aliança MRPP-PPD”, como lhe chamou mais tarde o próprio Balsemão.
Sublinhando que “sempre se deram todos bem”, lembrou uma iniciativa que se revelou eficaz: “Quando o pêndulo começou a ir completamente para a esquerda fiz uma assembleia geral de trabalhadores e pus as minhas condições para continuar. E obriguei-os a votar. Isso definiu as regras.” Apesar do êxito editorial, 1975 foi também o período mais vulnerável da vida do jornal, em termos financeiros. A seguir ao golpe de 11 de março, o PREC guinou à esquerda. A Assembleia do MFA decidiu nacionalizar a banca e os seguros, o governo provisório do general pró-comunista Vasco Gonçalves executou a medida. De um dia para o outro, a publicidade aos bancos e às seguradoras, que eram os maiores anunciantes nas páginas do jornal, foi substituída por um anúncio genérico: “A banca é do povo”. O corte das receitas de publicidade foi, para Balsemão, “o pior” momento: “Temi que o jornal acabasse”, disse ao Expresso em 2013.
A 25 de abril de 1975, Pinto Balsemão foi eleito deputado à Assembleia Constituinte por Lisboa. Ainda nesse ano deixou o escritório de advogados que partilhava com Francisco Costa Reis, também administrador do Expresso. Balsemão, o político, tinha sempre à perna Balsemão, o jornalista. Quando Sá Carneiro teve que ser substituído no cargo de secretário-geral do PPD devi- do à doença que o manteve em Londres durante longos meses, Balsemão foi pressionado por muitos sá-carneiristas para se candidatar à liderança. Mas o diretor do Expresso recusou-se terminantemente a largar o jornal. Nem por isso deixou de se envolver – cada vez mais – nas lutas internas pelo poder que, nos meses e anos seguintes, o opuseram sucessivamente a Sá Borges, Vasco Graça Moura, Emídio Guerreiro, Mota Pinto ou Sousa Franco. Sempre ao lado de Sá Carneiro. Mesmo quando, no auge do “Verão Quente”, se recusou a publicar no Expresso uma entrevista em que aquele, preparando o regresso a Portugal, não poupava críticas ao Grupo dos Nove. O pretexto – irrespondível – para a recusa foi o facto de o texto ter chegado já depois do fecho da edição. Na verdade, Balsemão, que acompanhava diariamente, no terreno, a evolução da situação política e militar, sabia que era preciso cultivar as boas relações com aquele setor do MFA que, daí a semanas, haveria de derrotar, de armas na mão, a fação totalitária. Foi o cair do pano sobre o PREC, a 25 de novembro de 1975.
Com a vitória da Aliança Democrática (AD, coligação PSD-CDS-PPM apoiada pelo Movimento dos Reformadores, dos ex-ministros socialistas Medeiros Ferreira e António Barreto) nas eleições legislativas intercalares de 2 de dezembro de 1979, a direita conquistou o poder pela primeira vez desde o 25 de Abril. Sá Carneiro formou o primeiro governo de maioria absoluta do atual regime, tendo como vice-primeiro-ministro o líder centrista Freitas do Amaral. Para ministro-adjunto do primeiro- -ministro convidou Pinto Balsemão. Foi por isso que na edição do Expresso de 5 de janeiro de 1980, pela primeira vez desde o número 1, o semanário saiu sem o nome do fundador no cabeçalho, substituído por Marcelo Rebelo de Sousa, como diretor interino. Pinto Balsemão esteve com Sá Carneiro até ao fim, empenhado na conquista de “um governo, uma maioria, um presidente”. O presidente seria o general Soares Carneiro, escolhido pela AD para desafiar Eanes, que reunira o apoio de toda a esquerda, incluindo o PCP cujo candidato, Carlos Brito, desistiu a favor do presidente em funções. Três dias antes da eleição, a 4 de dezembro, Sá Carneiro e Amaro da Costa, ministro da Defesa e número 2 do CDS, morreram quando a avioneta em que voavam para o Porto, onde iam fazer um comício, se despenhou em Camarate, na periferia de Lisboa.
Freitas do Amaral assumiu a chefia interina do executivo enquanto no PSD se iniciava um mês de conspirações e intrigas que armadilharam a sucessão do “herdeiro natural”: desde a morte de Sá Carneiro, Francisco Pinto Balsemão tornara-se o militante nº 1 do partido. À medida que se contavam as espingardas, percebeu-se logo de onde viriam os apoios e os desapoios, que em breve passariam a ataques. Os apoios vieram das ilhas, através dos líderes regionais dos Açores, Mota Amaral, e da Madeira, Alberto João Jardim; da JSD, então presidida por António Lacerda Queiroz; e dos sindicalistas da Tendência Sindical Reformista Social-Democrata (Tesiresd), antepassada dos TSD. Contra Balsemão movimentaram-se desde logo Eurico de Melo, um dos barões nortenhos mais influentes no partido, que lançou todo o seu peso na promoção do então pouco mais que obscuro ministro das Finanças, Cavaco Silva; e o ministro da Agricultura, Cardoso e Cunha. Balsemão marcou o seu território e ganhou a votação decisiva no Conselho Nacional que o entronizou como novo líder do PSD. No dia 9 de janeiro de 1981 tomou posse como chefe do VII Governo Constitucional.
Pormenor significativo: o CDS deixava de estar representado no governo ao mais alto nível – não havia vice-primeiro-ministro, apenas ministro de Estado, lugar ocupado por Basílio Horta. Outro “detalhe”: Eurico de Melo ficava de fora do elenco ministerial.
Os meses seguintes foram de constante atrito. Em vez de se dedicar em exclusivo à governação, aos dossiês da integração europeia e às negociações com Mário Soares para a revisão constitucional, Balsemão teve que passar a maior parte do tempo a defender-se das facadas nas costas, vindas da coligação e do seu próprio partido. Em agosto, fartou-se e, como contaram os jornais, “deu um murro na mesa”: apresentou a demissão. O estrondo do “murro” chamou à ordem os parceiros da maioria parlamentar. Dias depois, Balsemão voltava a Belém para dizer a Eanes que tinha reunidas as condições para formar um novo executivo. O VIII Governo Constitucional tomou posse a 4 de setembro de 1981. Como sinal da “vitalidade” da AD marcavam presença Freitas do Amaral, como vice-primeiro-ministro, e até o monárquico Gonçalo Ribeiro Teles, líder do pequeno PPM, acumulava o lugar simbólico de ministro de Estado com a pasta da Qualidade de Vida. O segundo governo Balsemão não teve direito a “estado de graça”. Foi torpedeado de todos os lados, sobretudo de dentro. Os jornais não o poupavam, a começar pelas caricaturas do cartunista Augusto Cid – militante da primeira hora do velho PPD, autor dos primeiros cartazes do partido. Desde que o governo aceitara a tese do acidente como explicação para a morte de Sá Carneiro, Cid passara a desenhar a cara de Balsemão sem olhos nem nariz; a partir do famoso episódio do “murro na mesa”, o primeiro-ministro passou a ser caricaturado sempre com a mão engessada…
Em 1982, farto de continuar a pagar para ser o bombo da festa no seu jornal, o primeiro-ministro convidou Marcelo para ministro dos Assuntos Parlamentares. Nem assim pararam as críticas do Expresso ao fundador – e aumentaram as fugas de informação. As relações com o presidente Eanes tornaram-se desastrosas. A desconfiança chegou ao ponto de Eanes passar a gravar as conversas entre ambos. Duas coisas correram bem: a revisão constitucional, aprovada com os votos do PS, que reduziu os poderes presidenciais e extinguiu o Conselho da Revolução, consagrando definitivamente o modelo de democracia ocidental; e as negociações para a entrada na CEE, cuja parte técnica ficou concluí- da no mandato de Balsemão. Em dezembro de 1982, na sequência da conquista de várias câmaras municipais pela oposição – embora a AD tivesse mantido o primeiro lugar em número de votos –, Freitas do Amaral tirou o tapete a Balsemão, no que foi logo acompanhado por muitos barões do PSD, queixosos da “incapacidade de liderança” do primeiro-ministro. Pela última vez, Balsemão apresentou a demissão do seu governo.
Demissionário desde 20 de dezembro de 1982, Balsemão só conseguiu ver-se livre das obrigações de primeiro-ministro quase seis meses depois, a 9 de junho de 1983, com a tomada de posse do governo do “bloco central”. Passou a pasta a Mário Soares e voltou para o seu gabinete da Rua Duque de Palmela onde, além de comandar o Expresso – embora não voltasse a ser diretor –, se dedicou a novos projetos. O militante nº 1 do PSD não abandonou por completo a vida partidária: durante muitos anos, os protagonistas dos congressos continuaram a procurar o apoio dos “balsemistas”. Mais discreto mas não menos influente foi o papel desempenhado no Clube de Bilderberg, um grupo seleto que desde 1954 reúne a elite mundial da política, da economia e dos media. O clube, que tomou o nome do hotel holandês onde se realizou o primeiro encontro, foi criado para reforçar o atlantismo, numa altura em que o antiamericanismo crescia na Europa. Os apreciadores das teorias da conspiração dizem tratar-se de um dos centros do governo secreto do mundo. Balsemão pertenceu ao ‘steering committee’ (direção) de 1983 a 2015 e ao longo desses 32 anos convidou para os encontros anuais de Bilderberg gerações de líderes do governo, da oposição e de opinião.
Em 1986 foi convidado por Raul Solnado para abrilhantar o concurso Faz de Conta, na RTP, integrando uma banda recheada de ex-governantes: além de Balsemão à bateria, Vasco Vieira de Almeida (ministro da Coordenação Económica do I governo provisório) ao piano e Daniel Proença de Carvalho (ministro da Comunicação Social no governo de Mota Pinto) no baixo. A partir de 1987 entregou-se ao projeto de lançar um canal privado de televisão em Portugal. A “primeira pedra” foi a gravação de uma cassete vídeo em que figuras relevantes da sociedade portuguesa se manifestavam a favor da necessidade de televisão privada no país. Com a aprovação da revisão constitucional de 1989, a sua concretização tornou-se possível: o fim da irreversibilidade das nacionalizações abriu a comunicação social à iniciativa privada.
Por essa altura já Balsemão aplanara o terreno e se familiarizara com o mercado audiovisual, constituindo duas empresas nessa área, uma para comprar direitos de filmes e a respetiva edição em videocassete, outra para a comercialização das cassetes. O trabalho de casa foi complementado com o estudo ‘in loco’ de uma das mais eficazes “oficinas” de televisão do mundo.
Balsemão contou numa entrevista à Notícias TV que foi ao Brasil falar com os patrões das principais redes: “Tive logo a certeza de que precisava de um aliado, de um sócio que soubesse mais de televisão do que eu.” Encontrou-o em Roberto Marinho, da Globo. Os responsáveis técnicos da rede aconselharam-no sobre o equipamento a comprar. Já os especialistas em programação “destruíram boa parte” do projeto de grelha que lhes apresentou. Além da Globo, Balsemão convidou para sócios da Sociedade Independente de Comunicação (SIC) distribuidores de cinema como a Castello Lopes e a Lusomundo, além de grupos de media como as Publicações Europa- -América, a Porto Editora, as Publicações Projornal, o grupo Impala e os grupos financeiros Mello, Espírito Santo e Riopele, entre outros. O ano de 1991 foi de guerra surda nos bastidores, com a mobilização de lóbis políticos, empresariais, mediáticos e religiosos. O governo de Cavaco Silva anunciou que ia abrir concurso para a atribuição de duas licenças para a concessão de canais televisivos privados. Quando a poeira assentou, havia três candidatos fortes no terreno. A começar pelo Patriarcado de Lisboa, a quem há muito o poder político prometera um canal de televisão, e que apresentava como trunfos principais a influência ímpar da Igreja Católica na sociedade portuguesa e o sucesso do grupo Renascença no universo da rádio. Para a generalidade dos observadores, Cavaco não podia correr o risco de alienar os católicos e, por isso, um dos canais disponíveis estaria “reservado” à partida para a Televisão Independente (TVI), vulgo o “canal da igreja”. Restavam a SIC de Balsemão e a TV1 – Rede Independente, projeto liderado por Proença de Carvalho e com a participação do grupo do Correio da Manhã, então liderado por Carlos Barbosa (hoje presidente do Automóvel Club de Portugal). Por fim o governo revelou a sua escolha: SIC e TVI. A SIC começou a emitir em outubro de 1992, no dia 6 – um fetiche de Balsemão: “Quando posso, arranco com os meus projetos num dia 6: o Expresso começou a 6, o PSD foi anunciado num dia 6, a Caras saiu num dia 6. A SIC Notícias só não iniciou as emissões a 6 porque era um sábado”, disse, anos mais tarde, à Notícias TV. “Não sou supersticioso, mas, se puder ser a 6, é.”
Em pouco mais de dois anos, a SIC foi açambarcando audiências. Em 1994 era líder depois do Jornal da Noite, no ano seguinte destronou a RTP no horário nobre. O êxito dos formatos de entretenimento e a irreverência que se tornou a imagem de marca dos seus programas de informação fizeram da SIC um ‘case study’ em matéria de televisão. E confirmaram Balsemão como um grande patrão da comunicação. Em 1997, o “fenómeno” SIC atraiu a atenção do canal franco-alemão Arte, que enviou uma equipa aos estúdios de Carnaxide para gravar o documentário “Esta televisão é a vossa”. A emissão ficou célebre porque, em plena euforia de audiências e publicidade, o então diretor-geral Emídio Rangel disse que “uma estação que tem 50% de share vende tudo, até o Presidente da República!
À frente de um império da comunicação – à escala portuguesa –, Balsemão passou boa parte da vida a reagir a ataques e a tentativas de “matar o pai”, como ele lhes chamava. Começou quando era primeiro-ministro: “Uma das razões por que chamei o Marcelo Rebelo de Sousa para o Governo foi para o afastar do jornal.” A segunda crise foi em 1989, quando a redação sofreu uma autêntica sangria, tal a quantidade de jornalistas que acompanharam Vicente Jorge Silva, até então coordenador da revista do Expresso, na mudança para o Grupo Sonae, para fundar o matutino Público, que sairia em março de 1990. O dono do Expresso entendeu-se diretamente com o patrão rival: “Aí, foi: querem luta? Vamos à luta. Desde que eu falo para o Belmiro de Azevedo e pergunto se aquilo é a sério e ele diz que sim, então vamos para a frente.”
Balsemão resistiu sempre à tentação de lançar um jornal diário, mas defendeu o seu “navio almirante” com unhas e dentes.
Fonte: Diário de Notícias

