Património Imaterial
Festa e Romaria de São Tomé de Ançã

A “Festa e Romaria de São Tomé de Ançã” consiste numa festividade de caráter profano e religioso que se realiza anualmente, de 24 a 26 de julho, na vila de Ançã. Com provável origem no século XIX, reúne a população da Vila e arredores nos diversos momentos que a compõem: entrega das bandeiras ao Juiz da festa, acompanhamento até casa do Juiz e daí à Capela de São Bento e sucessiva bênção do gado e missa, cortejo alegórico pelas ruas da vila, escolha do novo Juiz e entrega das bandeiras à família responsável pela sua guarda e preservação.
A festa manteve o seu caráter rural durante dezenas de anos, tendo vindo a evoluir e a modificar-se ao longo do tempo, mas nunca perdeu esta matriz inicial, composta pelos elementos enumerados anteriormente e que são considerados, por tradição e prática instituída, as suas características essenciais.
Por apresentar um complexo conjunto de elementos de festa profana e de romaria religiosa (como a questão das bandeiras e da figura do Juiz, das cavalhadas, do cortejo, do pagamento de promessas a São Tomé, bênção do gado e missa) esta manifestação tem um raio de atração considerável, especialmente pela região do Baixo Mondego, cuja ligação a Ançã é secular.
No dia 24, na Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó, o Presidente da Junta de Freguesia entrega ao Prior da Vila a Bandeira de São Tomé. De seguida, o Juiz da Festa recebe a Bandeira de São Tomé, sendo aclamado pela população no adro da Igreja Matriz. É também entregue a Bandeira do Anjo à criança escolhida pelo Juiz para desempenhar este cargo.
O cortejo que se forma desde a Igreja Matriz até casa do Juiz é constituído, primeiramente, por um grupo de gaiteiros tradicionais seguido da criança com a bandeira do Anjo, do Juiz empunhando a bandeira de São Tomé, de banda filarmónica, usualmente a Phylarmonica Ançanense, e da população que se junta.
No dia 25, o Juiz aguarda a chegada dos gaiteiros e da filarmónica, dirigindo-se à Capela de São Bento. Neste momento já se encontram presentes dezenas de cavaleiros que começam a constituir as tradicionais cavalhadas. O Juiz leva a bandeira a cavalo, acompanhado do Anjo da Festa. À chegada, são dadas três voltas à capela, no sentido inverso ao dos ponteiros dos relógios, pelo Anjo, Juiz e restantes cavalhadas. No alpendre da capela o Pároco da Vila procede à Bênção Solene do Gado – benzendo todos os animais dos romeiros (inclusive animais de estimação).
Na tarde deste dia realiza-se um cortejo alegórico, que abre com os gaiteiros, seguidos de diversos carros alegóricos, com reconstituições etnográficas, históricas, do quotidiano da Vila ou de temática humorística. À chegada a São Bento são dadas três voltas à Capela, novamente em sentido inverso ao dos ponteiros dos relógios, e espera-se que alguém se ofereça para Juiz da Festa do ano seguinte.
No último dia, a 26, forma-se o cortejo inverso ao de dia 24. Novamente encabeçado por gaiteiros, seguido do Anjo, do Juiz Novo, e da banda filarmónica, tem por destino a Igreja Matriz, onde as Bandeiras são entregues ao Prior, cabendo a sua guarda ao Presidente da Junta de Freguesia.
A população local é o maior agente de transmissão do culto de São Tomé. Associações como a Phylarmonica Ançanense, o Ançã Futebol Clube e o Grupo Típico de Ançã têm tido um papel fulcral na organização e manutenção da estrutura desta festividade, assim como a Junta de Freguesia da Vila de Ançã.
A proposta de inscrição da “Festa e Romaria de São Tomé de Ançã” no INPCI foi apresentada pelo Grupo Típico de Ançã, em colaboração com a Junta de Freguesia de Ançã, tendo por base o trabalho de investigação e documentação do investigador Roger Lee de Jesus, realizado com recurso a recolhas no terreno junto da comunidade.
Esta inscrição reflete os critérios constantes no artigo 10.º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 149/2015, de 4 de agosto, com destaque para a importância da manifestação enquanto prática religiosa e identitária da população da vila de Ançã, no concelho de Cantanhede, os processos sociais e culturais nos quais teve origem, com fontes documentais que remontam ao século XIX, e as dinâmicas de que são hoje objeto a manifestação, bem como as medidas de salvaguarda propostas para assegurar a sua valorização e viabilidade futura, envolvendo a comunidade de Ançã e os agentes locais, nomeadamente associações e o poder autárquico local.